Imagem do Mês: Pela segunda vez, trabalho de Eduardo Anizelli é eleito destaque de julho

Em maio, Eduardo Anizelli estava há 6 meses no Rio de Janeiro e registrava a Chacina da Vila Cruzeiro – a segunda operação policial mais letal da história da cidade – e tinha o trabalho escolhido como imagem do mês da ARFOC-SP. Dois meses depois, o fotojornalista se viu em uma pauta parecida: Mais uma operação policial, desta vez no Complexo do Alemão, e teve este registro também eleito como foto do mês.

“É um super reconhecimento. Isso dá um combustível para a gente.”, diz o profissional.  “Por outro lado, uma pena por ser duas fotos seguidas do mesmo tema. Mal tinha esquecido da Vila Cruzeiro e vem o Alemão.”

É a primeira vez, desde que o reconhecimento pela foto do mês da ARFOC-SP ganhou um novo formato em setembro de 2021, que um profissional recebe a honraria duas vezes.

“É um enorme prazer para mim ter o trabalho reconhecido quase dois meses seguidos pela ARFOC-SP, com tanto material bom que chega todo dia do Brasil todo.”, comemora Anizelli.

A comemoração, no entanto, vem acompanhada de uma certa tensão, tanto pela complexidade do tema registrado nos trabalhos quanto por saber que eles talvez, e provavelmente, não sejam os últimos confrontos violentos registrados pelo profissional.

Apesar de dados oficiais apontarem a operação policial no complexo do Alemão, ocorrida em julho, como menos letal do que a da Vila Cruzeiro e das semelhanças entre as duas operações, Anizelli conta que esta última foi uma pauta mais tensa e exigiu ainda mais atenção e esforços porque ele e a imprensa presente tiveram mais acesso ao local do confronto e às cenas fortes que aconteceram nele.

“A gente conseguiu chegar e entrar na comunidade pelo menos umas duas vezes para ajudar os moradores a retirar os corpos, porque a polícia não estava retirando.”, conta ele.

O autor da foto do mês relembra que ao ficar sabendo da operação policial, começou a acompanhar os jornais locais atento às notícias e números de mortes.

Ao perceber que o encerramento da operação estava longe de acontecer, ligou para o motorista do jornal, vestiu o colete balístico e foi para a entrada da comunidade, onde ficou com outros fotógrafos, até um grupo de direitos humanos e moradores os convidaram a entrar.

RIO DE JANEIRO, RJ, BRASIL, 02-04-2022: (Foto: Eduardo Anizelli/ Folhapress, COTIDIANO)
Foto: Eduardo Anizelli

“A gente entrou ali junto com a comunidade e foi seguindo até chegar a primeira barricada da polícia. Acho que rolou uma tensão ali quando eles viram jornalistas. Estava nítido que eles não queriam a gente alí.”, conta Anizelli. “Por outro lado, também estava nítido que a população queria a gente alí para poder resgatar as pessoas que estavam ali feridas e precisavam sair.”

“Em um dado momento, apareceu umas pessoas carregando um corpo, parecia ser um corpo já morto mas não era. Era esse cara da foto que estava sendo socorrido.”, explica Anizelli sobre o momento do registro da imagem escolhida como foto do mês de julho da ARFOC-SP.

“Ele tinha tomado um tiro na perna e estava sendo socorrido, ele estava sendo carregado em cima de um lençol até que chegou em um carro mais próximo da saída da comunidade. Colocaram ele na caçamba da caminhonete, foi onde eu fiz essa foto.”, completa.

Como o carro não funcionou, teve que ser levado até a saída da comunidade em um carrinho de supermercado. O momento foi registrado em sequências que compõem o trabalho de Anizelli, publicado no Instagram da ARFOC-SP.

“Ele saiu carregado por esse carrinho gemendo de dor e foi levado igual mercadoria”, diz o fotojornalista, que mais tarde descobriu que a pessoa fotografada era procurada no Pará pela morte de policiais.

“É uma coisa muito forte de ver, né? Uma pessoa alí, independente do crime que ela cometeu ou não – não cabe a mim julgar e sim reportar – saindo como se fosse um quilo de carne em um carrinho de compra.”

Mas nem de imagens trágicas vive o fotojornalismo e o fotojornalista Eduardo Anizelli. Embora o autor das imagens do mês tenha sido reconhecido por dois trabalhos relacionados a confrontos violentos, além da participação em outras coberturas trágicas como enchentes em Petrópolis no início ano, o profissional destaca as belezas da “cidade maravilhosa.” que também leva na bagagem até então.

“Acho que até agora o saldo está mais para violência do que para coisa calma, mas o Rio tem dessas.”, reflete ele. “O que dá para ser destacado e que mais gostei de fazer foi o Gilberto Gil recebendo o título de imortal [na Academia Brasileira de letras] e depois o retrato dele, que tive o prazer de fazer, mesmo que rápido, mas foi uma coisa bacana que marcou o aniversário de 80 anos dele.

Texto: Por Bruna Nascimento

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