Trabalho de Brenda Alcântara em velório do indigenista Bruno Pereira é primeiro vídeo a ser escolhido como imagem do mês Arfoc-SP
“Cadê meu irmão?” Era a pergunta cantada por indígenas Xucurus na cerimônia em memória ao indigenista Bruno Pereira em Recife-PE. O Momento foi registrado por Brenda Alcântara e escolhida como imagem do mês de junho da Arfoc-SP.
Bruno Pereira e o jornalista Dom Philips foram assassinados durante uma expedição na região do Vale do Javari, no Amazonas. Trazendo à tona a crueldade presente em um país que mata quem dedica ativamente a vida em prol de um Brasil melhor, defendendo a causa ambiental e indígena.
“O fotojornalismo está aí justamente para servir como este meio em que a gente consegue adentrar em camadas que ou são invisibilizadas ou não têm o destaque que merecem ter.”, conta a fotógrafa do Pernambuco e autora da imagem de Junho da Arfoc-SP, Brenda Alcântara.
Essa é a primeira vez que um vídeo é escolhido como imagem do mês. Para a autora da imagem, que é fotógrafa desde 2012, o vídeo realizado no velório de Bruno Pereira demonstra a transformação da profissão ao longo dos anos, onde o fotógrafo virou um produtor de imagens de uma forma geral, o que inclui agregar o audiovisual entre as produções.
“No vídeo a gente consegue fazer um compilado de grandes imagens e construir, fazer uma teia neste fio condutor da narrativa. Mas a foto às vezes é uma foto só que às vezes consegue transmitir tudo.”, diz a Brenda Alcântara.
A profissional conta que costuma ser defensora da foto como linguagem escolhida nas pautas, mas que ao ouvir os cantos indígenas, sentiu que o vídeo era a melhor forma de resumir, especialmente, aquele momento.
“Quando eu cheguei e vi aquele canto e aqueles povos indígenas caminhando para o local onde estava o processo de velório do Bruno eu olhei e falei: ‘Aqui sim, são várias fotos mas esse canto é o grande vídeo'”, relembra ela.
Brenda fazia a pauta, tanto em vídeo quanto em foto, para uma agência internacional. Ela encara o momento como um processo de volatilidade e interligação do jornalismo, fotojornalismo e a importância da comunicação.
“Essa pauta, especificamente, traz muita ressignificação dessa construção da gente como produtor de imagem de uma forma geral. Como o jornalismo e o fotojornalismo estão interligados nestas transmídias. A gente está o tempo todo lidando com formatações e reformatações de como funciona o nosso trabalho.”, explica Brenda.
A fotojornalista conta, ainda, que a pauta trouxe outros desafios. A profissional não sabia que haveria a presença e homenagens dos indígenas até ouvir o canto, por exemplo.
“Pautas como essa demandam da gente uma entrega muito grande. Eu estou de corpo presente alí, ativo com toda atenção do mundo. É como se eu estivesse sempre tendo que pensar um passo à frente do que qualquer situação pode acontecer”, diz.
Curiosamente, enquanto registrava aquela que seria escolhida como imagem do mês da Arfoc-SP, Brenda Alcântara não conseguia conter a emoção que a pauta trazia.
“Foi muito impactante porque enquanto eu estava filmando eu estava me acabando de chorar.”, relembra Brenda, “Porque eu estava sentindo exatamente tudo aquilo que estava acontecendo”.
Enquanto há profissionais que defendem a distância emocional da pauta, a autora da imagem do mês de junho se permitia sentir a revolta e tristeza. Mas a melhor parte, é que embora haja diferentes formas de viver e fotografar os momentos, não há uma regra.
“Se meu trabalho é servir como um meio catalisador, se meu trabalho é justamente criar essas pontes de interligação, se eu não me permito sentir, o que eu estou fazendo?”, reflete a profissional.
Com uma carreira construída por imagens ligadas à de Direitos Humanos, Brenda defende que ser humana vem antes de ser fotografa. E que a construção como profissional só é possível a partir dos sentimentos e construções de suas vivências enquanto ser humano e mulher.
“Por isso que, inclusive, eu estou todo dia fotografando com um olhar diferente. Todo dia eu sou uma Brenda diferente.”, conta ela.
Segundo esta ótica, fotografar, portanto, não é necessariamente se distanciar e registrar a imagens, mas também expor ao público os sentimentos que passaram primeiro ao seu olhar. A única lição, no entanto, é o que fazemos com nossas emoções, que não podem intervir no momento da foto ou vídeo, tampouco paralisar o autor da imagem.
“Eu me permito sentir, eu não me permito intervir, esse é o ponto. Acho que é esse o limite, o meu sentimento ele tem que ser só meu naquela situação.”, diz Brenda.
Veja o vídeo com a entrevista abaixo.
Texto e entrevista: Bruna Nascimento | Arte: Levi Bianco