Imagem do Mês: No front da Guerra entre Rússia e Ucrânia, Yan Boechat registra imagem de março
“Algumas vezes nós mediamos a realidade, mas na maior parte das vezes, nós só registramos. E a realidade é feia às vezes. É cruel”, conta o jornalista Yan Boechat, cujos olhos e lentes estão responsáveis por registrar a realidade do atual conflito entre Rússia e Ucrânia. Um desses registros foi selecionado como foto do mês de março da Arfoc-SP.
A imagem feita na entrada de Irpin, cidade da Grande Kiev, — capital ucraniana — mostra homens acusados de saquear casas abandonadas, amarrados a postes com sacos plásticos e com as calças tiradas, em uma temperatura próxima de zero graus celsius.
“Irpin era, naquele momento, o frontline da guerra. Os Russos tinham descido desde a fronteira, passando por Chernobyl e chegaram a uma cidade chamada Butcha”, explica o jornalista.
Segundo Yan Boechat, com Irpin sob controle ucraniano e a cidade vizinha Butcha sob controle russo, o local estava violento com a pressão militar da Rússia. Ele acompanhava e registrava os conflitos.
“Foi um dia bastante violento, com muita artilharia, muita gente ferida. O front estava muito ativo neste dia.”, narra o profissional, que conta que quando decidiu ir até um local mais seguro no fim do dia em busca de transporte e alimentação, se deparou com o que seria a imagem registrada na foto do mês.
“Eu de longe vi essa cena e fiquei bem impressionado com ela também, num primeiro momento eu achei que eram soldados russos ou colaboradores. E fiquei de longe vendo aquela situação e fotografando meio que escondido.”, conta o jornalista.
Foi depois que Yan Boechat foi se aproximando e fotografando mais de perto a cena chocante, que descobriu não se tratar de soldados russos, mas de homens acusados de serem saqueadores punidos por soldados ucranianos, que ainda encheram a boca dos acusados com batatas, os impedindo de falar.
“Achei que era uma cena marcante. Depois teve muita crítica sobre essa foto, muitos colegas criticaram, dizendo que eu não deveria ter exposto as pessoas. Mas acho que era uma cena que tinha valor jornalístico, que precisava ser retratada, enfim, fiquei feliz com o resultado. Triste com a situação, mas feliz com o resultado.” Conta.
Para Yan Boechat, profissional referência na cobertura de conflitos internacionais, ver a história acontecer diante dos olhos é um privilégio que o motiva a fazer o trabalho, muito mais do que acreditar que as fotos são capazes de causar impacto direto na vida das pessoas.
“Acho que o passado tem mostrado que não, a gente não consegue mudar o curso da história, que as forças que têm o poder são muito mais poderosas do que a gente e elas conseguem fazer um controle da opinião pública muito mais eficaz do que a gente pode crer”, explica.
“Então eu tenho poucas esperanças de que minhas fotos vão alterar o rumo da história e que elas causarão impactos suficientes para que quem tem poder, mude o curso das coisas”.
No entanto, o trabalho jornalístico feito com responsabilidade por Yan e demais profissionais cumpre a missão de expor e informar sobre os acontecimentos históricos e com valores coletivos. E se estamos diante de situações mundialmente relevantes, são imagens como essa que nos ajudam a compreender a realidade e a sermos impactados por ela.
“Acho que a gente está fazendo os rascunhos da história, nós somos aqueles que estamos lá sem interesses diretos no conflito”, diz Yan Boechat. “Nós somos os que vão mostrar, talvez de forma menos enviesada, as coisas que estão acontecendo. Apesar de todo viés que há na grande imprensa”, conclui.
Texto: Bruna Nascimento | Foto: Yan Boechat | Arte: Levi Bianco