Maio Fotografia 2017 no Mis

 

 

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 Texto e fotos Monica Bento

MAIO FOTOGRAFIA 2017
MIS | Museu da Imagem e do Som  www.mis-sp.org.br
Av Europa 158, Jd Europa +55 11 2117-4777

13 de abril a 28 de maio de 2017

Seguindo a programação do Maio Fotografia, evento anual que em sua sexta edição conta a história da fotografia, traçando um panorama da primeira foto tirada em 1826 às imagens produzidas e compartilhadas por smartphones , o Mis realizou em paralelo ciclo de conversa sobre duas exposições que merecem destaque a seguir: Revista Camera – A Fotografia dos séculos XIX e XX e Farida, um conto sírio. Com conteúdos e propostas visuais distintas, as duas mostras trazem a tona o papel da fotografia e mostram como a imagem pode ir além de sua concepção estética, documental ou jornalística. Os encontros foram marcados por presenças ilustres e emocionantes discussões sobre a fotografia de todos os tempos .

A primeira exposição traz uma seleção de imagens da coleção da cultuada revista Camera (1966-1981). Dividia em dois períodos, séculos XIX e XX, podemos ver através das imagens o percurso da fotografia ao longo dos anos até chegar ao status de arte. A revista foi pioneira na formação de gerações de fotógrafos, criando tendências tanto nas publicações quanto no design gráfico, editada em três línguas (alemão, inglês, francês), com periodicidade mensal e distribuída em 35 países. Em seu acervo, com mais de 3 mil imagens entre documentos, negativos e impressões, constam nomes como André Kertész, Cartier Bresson, Robert Frank, William Klein, Josef Koudelka, Diane Arbus, Man Ray, Richard Avedon e muitos outros, sendo o Brasil muito bem representado por Maureen Bisilliat e Claudia Andujar.

Definida como universal e poliglota, a revista ganhou fama na mão do visionário editor Allan Porter que durante 13 anos produziu verdadeiras preciosidades com sua ousadia e requinte editorial. Priorizando a qualidade de impressão e utilizando papel diferenciado, cada edição focava em um tema que era explorado por diferentes olhares e a revista era produzida como uma obra prima. Ter um trabalho publicado era o sonho de qualquer fotógrafo da época. Essencialmente artística, tinha poucos anúncios e mais espaço para ensaios, linguagens e narrativas visuais, dando visibilidade aos fotógrafos e projeção internacional. Para o psiquiatra suíço Wulf Rössler, detentor da coleção e amante da fotografia “não era apenas uma revista, mas uma escola ! Mudou minha forma de fotografar e ver a fotografia”. Com o que chamou de “tsunami de imagens” que temos hoje em dia, Rössler afirma que o que realmente interessa é o valor que a fotografia agrega: “mais do que mera representação da realidade, gosto da linguagem subjetiva, que pode ser sublime ou indireta, mas que nos revela o inconsciente daquela cena. Tem alguma mágica na arte que toca as pessoas, esse é o ponto”!

Tentando aliar psiquiatria e fotografia, Dr. Wulf Rössler fez um link entre seu trabalho e sua paixão, propondo visitas guiadas à exposição para pessoas com problemas e transtornos mentais, usando a fotografia como instrumento de ação social e enfatiza: “a arte salva!”

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Mais informações podem ser encontradas no site da European Society for the History of Photography, que traz um documentário especial sobre a revista e seu principal editor, além de todas as capas http://www.eshph.org/blog/2016/02/29/allan-porter-2/ e para tê-las nas mãos, exemplares podem ser folheados nas bibliotecas Mário de Andrade e da USP. Segundo Armando Prado, professor e ex-colecionador da revista, ela ainda é uma referência nos dias de hoje: “saber o que já foi feito e ter influências é muito importante para quem está começando. A pesquisa e o estudo são fundamentais na produção de um trabalho consistente, que tem um sentido, que tem algo a dizer”.

Da história da fotografia para nossa história recente, a exposição Farida, um conto sírio é, antes de tudo, um conto de resiliência e dignidade. Narra a trajetória da família Majid, assim como tantas outras que tiveram que sair de seus países de origem em busca de uma vida melhor. Uma produção da Doc Galeria para o Maio Fotografia 2017, o encontro contou com a presença do fotógrafo Maurício Lima, integrantes da família Majid fotografada durante imigração da Síria para Suécia, Anemona Hartocollis jornalista do The New York Times e Mª Laura Canineu diretora da Human rights Watch no Brasil, com mediação da professora e crítica de fotografia Simonetta Persichetti. Durante toda palestra foram projetadas as 33 imagens que fazem parte da mostra e nos remetem a longa caminhada até a Suécia, que durou cerca de um mês.

Farida que em árabe significa “única” é a mais nova integrante da família Majid, que dá nome ao trabalho e rendeu ao fotógrafo o Prêmio Pulitzer 2016 juntamente com outros três colegas também do The New York Times, na categoria fotografia de notícias pela cobertura. Lima começou a falar pedindo 1 minuto de silêncio em homenagem aos refugiados do mundo todo. Emocionado, frisou a importância do trabalho da imprensa na ajuda humanitária: “a partir do momento que as imagens são publicadas, esperamos alcançar pessoas influentes que possam ajudar a mudar o rumo da história. Acredito que contribuímos para que a família Majid conseguisse ser aceita na Suécia pelo impacto da matéria, em um grande veículo de repercussão internacional”. Segundo Mª Laura Canineu do human Rights Watch no Brasil, uma coisa puxa a outra: “o papel das ONGS é fundamental para adaptação dos refugiados dentro da nova realidade e a força da imagem e do jornalismo são muito importantes, porque mostram a realidade para o mundo, reforçando o trabalho das entidades”.

Segundo a repórter americana Anemona Hatrocollis, o melhor jeito de se contar uma história é entender seu sentido: “acompanhar a família nessa travessia foi uma experiência inesquecível. Quando entrei na cobertura, a questão dos refugiados era algo vago para mim, mas esse trabalho deu um rosto a essa abstração. Hoje vejo o assunto com outros olhos e espero que o mundo reconheça a gravidade da situação”. Ao viverem tudo isso, puderam ter a dimensão do que estavam fazendo: “o choro das crianças dava um clima assustador, mas tínhamos um objetivo maior”. Para Maurício Lima direitos humanos é uma questão de empatia, de comprometimento e de se colocar no lugar do outro. Tinha uma tradutora com eles, mas muitas vezes bastava um olhar ou um gesto: “antes de ser fotógrafo eu sou um ser humano. A primeira reação é sempre fotografar, mas depois um tempo você percebe que tem que ser mais intuitivo, saber o que realmente quer mostrar”.

Depois de passarem muito medo, agora a sensação é de vida nova. Agradecidos e profundamente tristes, a família exprimiu sentimentos de paz, esperança e o desejo de um dia poder voltar à Síria. Estão se adaptando a nova realidade, com todas as dificuldades de um recomeço, mas com a certeza de um futuro melhor para as crianças. No encerramento, a fala de uma das crianças da família deixou bem claro que a história continua ! 

 

 

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